O DIAMANTE DA VERGONHA

OS EDUCADORES DO PARANÁ ESTÃO SENDO DESTRUÍDOS PELA TIRANIA PROTO- FASCISTA DO GOVERNO RATINHO JÚNIOR. A LUTA ORGANIZADA É A ÚNICA ESPERANÇA!

Desde o início do ano de 2019, ao assumir o governo do Paraná, Ratinho Júnior vem implantando um projeto de política educacional completamente antagônico à concepção de uma escola pública, democrática e de qualidade, defendida como direito pela classe trabalhadora. A passos largos, aproveitando-se das dificuldades de organização dos trabalhadores durante o período pandêmico, o secretário de educação Renato Feder, de forma autoritária e abusiva, “fez passar a boiada”.

Contando, por um lado, com a cumplicidade irresponsável da bancada parlamentar que apoia o governo e, por outro, com a incapacidade da direção do sindicato dos trabalhadores da educação pública do Paraná de organizar a categoria na construção de estratégias de resistência, muitos direitos foram subtraídos, muitas escolas foram militarizadas, os cargos dos Agentes Educacionais foram extintos, abrindo as portas para terceirização, os salários foram defasados e achatados, as práticas de assédio e de violência simbólica se intensificaram. Estabelecendo sofisticados e perversos mecanismos de opressão didático-pedagógica, impondo um currículo homogeneizador, nivelado por baixo, abstraído das condições socioculturais constitutivas dos sujeitos concretos do processo pedagógico, exigindo o uso de parafernálias tecnológicas alheias às necessidades escolares de ensino-aprendizagem, negando, enfim, a autonomia pedagógica das unidades de ensino e dos profissionais da educação. De espaços de promoção e de emancipação do humano, as escolas do Paraná vêm se transformando, dia após dia, em espaços de controle e subjugação, de forte hierarquização e subordinação, de perseguição, de criminalização, de assédio e de descartabilidade dos profissionais que ousam se opor a este projeto de desmonte da Educação Pública Paranaense.

Nossas escolas, certamente, já apresentavam inúmeros problemas pedagógicos anteriores ao atual governo. Hoje, entretanto, os problemas não são apenas pedagógicos, mas sim de saúde e de segurança públicas. O que há nas escolas públicas do Paraná é um absurdo estado de adoecimento profissional, a Síndrome de Burnout tornou-se endêmicaentre os educadores, naturalizou-se entre eles o uso de medicamentos para poderem trabalhar. O mal-estar, físico e psicológico, vivido nas escolas vem provocando indisciplina e violência, o que deveria ser resolvido pedagogicamente vem se transformando em caso de polícia.

Não satisfeito com todo esse quadro de terrorismo pedagógico, o secretário Renato Feder resolveu implantar novas estratégias de assédio moral contra os educadores, utilizando a falácia de que este assédio institucional seria uma forma de avaliação individual do trabalho docente. De novas, na verdade, essas estratégias não têm absolutamente nada! São estratégias vis e violentas, de desrespeito, de desqualificação e de perseguição profissional.

Além da Prova Paraná, uma avaliação em alta escala aplicada durante o ano letivo para verificar se os professores estão ensinando o que é imposto pelo governo através do currículo único rebaixado, está sendo exigido dos diretores escolares que entrem nas salas dos professores para observar como estes estão encaminhando suas aulas, se eles têm controle de turma, se têm domínio de conteúdo, se administram bem o tempo, se usam metodologias ativas etc. Não é preciso dizer, neste momento, como essa observação é arbitrária e constrangedora para profissionais diplomados, aprovados em concurso, pós-graduados, com anos de prática docente.

Mas isso não é tudo! Agora, de forma obtusa e estúpida, Renato Feder resolveu criar mais uma forma de “avaliação” esdrúxula: o “Professor Diamante”.

O chamado “Professor Diamante” é mais uma das estratégias do governo Ratinho Júnior para desqualificar, profissional e moralmente, os educadores do Estado. Este projeto apresenta, em planilha eletrônica, um questionário a ser respondido pelos estudantes com perguntas sobre o trabalho do professor e da professora. O objetivo claro das perguntas é saber se os professores estão trabalhando de acordo com o modelo imposto pela Secretaria de Educação, ou seja, se eles atendem ao modelo idealizado pelo governo, responsabilizando-os, individualmente, pelo visível fracasso desse modelo.

Entre as perguntas apresentadas no questionário, os alunos devem responder se o professor se atém ao conteúdo ou se divaga em outros assuntos, se o professor aproveita bem o tempo das aulas, se elas são dinâmicas e divertidas, se as metodologias são criativas, se os conteúdos são aprendidos, etc. Oras, qualquer néscio sabe que a grande maioria das aulas não atendem a esses critérios. Não atendem, obviamente, não por uma questão relacionada à qualidade dos educadores, mas sim pela ausência de condições estruturais concretas, imposta pela própria Secretaria de Educação. Como exemplos disso, podemos citar o excesso de tarefas impostas, o excesso de carga horária exigida e a falta de tempo hábil para os profissionais prepararem suas aulas. Tendo isso em vista, somado ao fato de que os estudantes da educação básica não têm formação pedagógica adequada para avaliarem o trabalho docente, fica explícito que as respostas obtidas serão baseadas em fatores puramente subjetivos, tais como “gosto ou não gosto de tal professor”, “o professor é chato ou é legal”, “o professor ouve ou não ouve a gente”, dependendo sempre das relações interpessoais construídas nas salas de aula.


O Diamante da Vergonha”, por Cyrillo Oliveira Junior (Peco) – Professor de Arte na Rede Estadual de Ensino do Paraná.

É claro que a construção de relações interpessoais favoráveis às práticas de ensino também são responsabilidade do professor e da professora. Entretanto, em um modelo de ensino fortemente verticalizado, em condições estruturais precárias, em um modelo em que a Secretaria de Educação manda fazer e o professor tem a obrigação de cumprir, como tarefeiro destituído de qualquer possibilidade de autonomia, não se pode, de forma alguma, avaliar individualmente o trabalho docente, ainda mais por critérios altamente subjetivos, guiados apenas pela emotividade.

Além de todos os problemas vividos pelos nossos educadores, em que essa avaliação poderá ajudar? Se o professor é avaliado negativamente, quais serão as ações do governo para contribuir com a melhoria de sua prática? Em nenhum momento as respostas a estas perguntas aparecem no projeto do governo. É óbvio que se trata de uma avaliação de caráter punitivo, de exclusão e descartabilidade profissional. O que o governo quer são professores feitos de “diamante”. Educadores que possam se submeter às condições degradantes de trabalho, impostas pela SEED, com um sorriso no rosto. Mesmo que este sorriso seja uma máscara fria, que esconde uma alma atormentada! Professores de carne e sangue, gente de tanta dor e sofrimento, gente que faz a terra girar, essa gente não interessa para o modelo pedagógico terraplanista do governo Ratinho Júnior.

Por princípio, não somos contra uma avaliação profissional. Ela é desejada e é justo que aconteça. Entretanto, em um sistema escolar que busque qualidade, ela precisa, inexoravelmente, ter como objetivo a valorização e a emancipação docente, diferentemente desta, e de outras formas de “avaliação” impostas pela Secretaria de Educação sob a gestão Ratinho Júnior/Renato Feder nos últimos anos, as quais buscam, apenas, avaliar para rotular e culpabilizar, em uma estratégia que beira o fascismo, estabelecendo a imposição de um pensamento único e de descartabilidade dos que não se adaptam, ou que ousam resistir. Sejam eles educadores ou estudantes!

A escola, certamente, não é uma empresa. O objetivo da escola não é o lucro, portanto, o conceito de qualidade escolar não tem o mesmo escopo de qualidade empresarial. A escola trabalha com o desenvolvimento de seres humanos, considerados em toda sua riqueza e complexidade. No cerne da formação docente, muitas vezes de forma idealista e salvacionista, está a firme convicção de que é possível tornar o mundo melhor, mais bonito e mais justo, através do ensino das ciências, das artes e da filosofia. Existe, no magistério, talvez como em nenhum outro exercício profissional, um forte compromisso ético com a vida. Não é por falta de vontade dos educadores que as escolas públicas estão longe de ter a qualidade que precisam ter. Não é porque os professores são vagabundos e descompromissados que o ensino público é deficitário. São as condições concretas de trabalho, impostas aos educadores, que inviabilizam o desenvolvimento de práticas necessárias ao processo de aprendizagem dos estudantes. Não raras vezes, inclusive, se as escolas têm alguma condição mínima de ensino é, também, por causa do compromisso destes mesmos educadores, os quais, junto com a comunidade escolar, sustentam – até mesmo financeiramente – as escolas, em detrimento do descaso do governo estadual.

Renato Feder, no livro “Carregando o Elefante”, diz, textualmente, que os professores são profissionais quase analfabetos. É a partir dessa compreensão, limitada e estúpida, que ele pensa a gestão da Secretaria de Educação do Estado do Paraná. De acordo com sua incapacidade de compreensão, os professores não sabem o que fazer, é preciso que ele, como um “reizinho mandão”, através de uma parafernália tecnológica alheia ao ambiente escolar, discipline o que e como os professores devem ensinar.

Sabemos muito bem que os objetivos de Ratinho Júnior são mercadológicos. A educação, para este governo, é um balcão de negócios ao qual as pessoas devem se sujeitar. É a lógica da imposição do lucro de poucos, sobre a vida e o futuro da nossa juventude. Entretanto, mesmo para uma perspectiva empresarial, a gestão de Renato Feder é burra e ineficiente. O bom empresário explora de seus trabalhadores o que eles têm de melhor, Renato Feder destrói o que os educadores são, tenta, através de pirotecnias de gestão, transformar gente de carne e sangue em algo frio e seco, como um diamante…

Sabemos bem quais são os princípios da lógica neoliberal e, infelizmente, ainda não atingimos o fundo do poço. Prevalecendo essa política educacional, em breve todos os educadores serão uberizados, irão receber por hora trabalhada e por meta atingida. Sabemos também que essa rota não será desviada se não houver enfrentamento político efetivo. A direção da APP-Sindicato – entidade que representa os trabalhadores da educação do Paraná – tem muita responsabilidade nesse processo. Desde o início do mandato de Ratinho Júnior, conhecendo o DNA desse governo, antes de organizar a categoria e fortalecer estratégias de resistência, a direção da APP optou pela tentativa de negociação. O que conseguiu, até agora, foi apenas negociar perdas, negociar a alma dos educadores e da escola pública.

Está na hora da direção da APP-Sindicato acordar e tirar o pijama, sair de trás da escrivaninha, abandonar o caráter de gestora de derrotas, parar de acreditar em um salvador da pátria ou de achar que tudo um dia vai se resolver de forma mágica. Passou da hora da direção sindical ir para as escolas, estabelecer relações efetivas com a base e construir uma greve geral por tempo indeterminado na educação do Paraná. Precisamos dizer um não definitivo, um não coletivo. Precisamos transformar toda a nossa angústia, a angústia de nossos educadores e de nossos estudantes, em luta efetiva.

Para finalizar, é preciso dizer que a gestão educacional de Ratinho Júnior e de Renato Feder merece um diamante. Merece um diamante manchado com o sangue de nossos colegas que, pautados no desespero devido às abusivas condições de trabalho que lhe foram impostas, adoeceram ou, até mesmo, tiraram a própria vida! Um diamante manchado de sangue, um Diamante da Vergonha! É isso que Ratinho Júnior e Renato Feder merecem! Em outros tempos, Geraldo Vandré nos ensinou que “quem sabe faz a hora e não espera acontecer”. Vivemos, mais uma vez, um tempo em que é preciso fazer a hora, fazer acontecer, nas ruas, nas escolas, nas praças… e não apenas nas urnas!

Autores:

Sebastião Donizete Santarosa – professor de Língua Portuguesa na Rede Estadual de Ensino do Paraná e militante na TLS Sindical.

Luciano Egidio Palagano – Funcionário de Escola na Rede Estadual de Ensino do Paraná, Conselheiro Nacional da CNTE e militante na TLS Sindical.

Paraná, Brasil

Outono de 2022